Há canalhas para todos os gostos. Seria preciso ocupar todo espaço deste blog para fazer uma classificação completa. Apenas a título de esclarecimento, daremos aqui uma resumida tipologia.
O Canalha metido à artista
Atuam no meio das Ciências Humanas, de forma desumana. São canalhas atores, diretores de cinema, publicitários, artistas plásticos, fotógrafos, músicos. Como o setor está muito ligado à mídia, são facilmente reconhecíveis.
O “canalha-dramaturgo” é um deles. O cara só fala de método Stanilawski, de distanciamento brechtiano, mas o que quer mesmo é uma aproximação prochaskiana no mulheril. O mais curioso nesse canalha é que ele se faz de fresco, visando um maior vínculo com a vítima, para logo em seguida mostrar seu verdadeiro objetivo: atingir o proscênio.
A versão Hollywood desse canalha é o que pega verbas governamentais para construir uma obra cinematográfica e termina construindo uma mansão de filme.
O “canalha-emepebê” é outro emblemático. Faz letras de música sobre as qualidades físicas de uma suposta mulher. Aí diz a várias outras “preparadas” que a canção foi feita exclusivamente para ela. Com isso, mantém o harém e a conta bancária recheada, pois os “canalhas-programadores-de-FM” adoram tocar esse tipo de música mela-cueca.
Apesar da multiplicidade canalhal, existe um ponto comum em todas as espécimes: canalha, que é canalha mesmo, manda todas as bolas para o gol. Mesmo que elas caíam fora do estádio.
Afinal, para fazer mil gols, Pelé teve que chutar mais de um milhão de pelotas para o mato.
O Canalha do setor público
Aqui, tanto podem entrar funcionários públicos civis, como militares e correlatos. Por exemplo: quer indivíduo mais canalha que o delegado Fleury? Uma flor de pessoa…mas, no escurinho de uma cela, era totalmente adepto da filosofia “água mole em pedra dura, tanto bate que a pedra confessa.”
Para ficar à altura dele, só o canalhésimo delegado Palhares, da peça “Beijo no Asfalto”, de Nelson Rodrigues. Um tipo que cantava viúva no dia do enterro do marido só para depois jogar um lero na neta do falecido.
Duque de Caxias também teve a sua porção Delegado Palhares. Mas no âmbito militar. Dizem que na Campanha do Paraguai ele jogava cadáveres com cólera, rio abaixo, para dizimar indiscriminadamente a população do Paraguai.
Como dizia Walter Franco num daqueles festivais canalhas da Globo: “é uma dor CANAAAAALHA!
O Ex-Marido canalha
Não aparece, não telefona, não manda e-mail e principalmente não paga a pensão alimentícia. Só nos momentos de carência afetiva liga para a ex-mulher e invariavelmente tenta levá-la para o motel mais próximo.
Quando consegue o intento, desaparece mais alguns meses. Para aparecer com a maior cara de bunda, outra vez, explicando que anda falido, doente, deprimido etc. A cantada do motel vem logo a seguir. E assim caminha o ex-marido bandalho.
A Imprensa Canalha
Quem nunca leu no banheiro uma revistinha de fofocas que garante que a Ana Maria Braga está tendo um affair com o Louro José? Que uma certa atriz pula a cerca com o personal trainer?
Quem não leu atire a primeira “Chiques, Milionários & Vaidosos” na minha cabeça. Mas cuidado: muito Simonal já rodou na mão desse tipo de publicação calhorda. Acontece que o “canalha-jornalista” é como o “canalha-PM”: primeiro bate, depois pergunta.
Nesta categoria também não pode faltar o indefectível “canalha-âncora.” É o que vai para a tevê jurar que a Bolsa está ótima, o dólar está sensacional, a Vale nunca esteve tão maravilhosa. E, no dia seguinte, o iBovespa despenca 3.700 pontos e uma fábrica da Vale explode e vira pó de traque.
A Canalha?
Pois é. Se elas estão conseguindo tanto espaço no mercado de trabalho, por que não deveriam passar a ser consideradas canalhonas como vós, caras-pálidas?
Dá para dizer que a torcedora racista do Grêmio, como todo aquele chororô, não se enquadra em todos os itens da Cartilha do Canalha Moderno?
E o que dizer daquela mocinha de Volta Redonda que cortou o pênis do namorado e jogou pro cachorro comer? Por essas e por outras, seria muito canalha não incluir mulheres nessa tipologia. E olha que nós nem mencionamos velhacas-mór. Daquelas que seduzem combalidos astros do rock para pleitear pensão alimentícia.
O Canalhinha
O especialista em canastrões, canalhas, cafajestes e cáftens, Nelson Rodrigues, dizia que “todo magro é canalha.” Mas, apesar da força da frase, não existe necessariamente um tipo físico próprio de canalha. Ele tanto pode ser um homenzarrão, um atarracado, um magro-sem-bunda, como um anão. Sim, os canalhas-nanicos existem e não são poucos.
Senão vejamos.
O anão vê o mundo de um ponto-de-vista diferente. Tudo que tem mais de um metro e dez centímetros é ameaçador para ele. Um pequinês é um dinossauro. Uma simples couve-flor é uma floresta amazônica. Tudo pode chutá-lo, machucá-lo, detoná-lo. Só resta ao anão ficar olhando para os seus agressores com cara de bundinha.
Isso provoca um estado permanente de irritação no domador-de-pulgas. É a chamada “neurastenia raquítica”.
Como não há ação sem reação, mesmo um anão termina se vingando do que o mundo lhe oferece. O mundo lhe agride? O anão devolve a agressão ao mundo. Como?
De uma maneira baixa. Alguém do seu talhe nunca vai poder pegar um marmanjo e lhe meter uns coques no cocoruto porque o cara lhe pisou na cabeça.
Então o que o canalhinha faz? Pode confundir-se com dóceis crianças no McDonald’s, descer o braço nelas e lhes tomar o McLanche Feliz. Pode fingir-se de menor abandonado e extorquir peruas que andam de BMW.
Pode-se concluir por estes comportamentos que nanicos, gnomos e elfos têm uma grande propensão à canalhice. Quem duvidar é só passar numa videolocadora e pegar o dvd do “Gremlins.”
Tatoo, da Ilha da Fantasia e Mini Me, de Austin Powers, também só enganam na tela. Porque, na real, tem a maior pinta de meio-canalhas.
Observação Final
Todo canalha, depois que faz uma cachorrada, manda flores.
+ O ABC do Canalha Moderno
+ Confira a segunda parte do texto: A Origem do Canalha
► Texto por Carlos Castelo. Escreve, desde sempre, para qualquer meio conhecido: jornais, revistas, sites, cinema, TV, propaganda etc. É um dos criadores do grupo de humor musical Língua de Trapo. Também é autor de nove livros que vão de crônicas a aforismos, passando por um romance policial e um infanto juvenil.
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