Como na clássica cena de Três Homens em Conflito, de Sergio Leone, o vídeo polêmico que viralizou nas redes sociais por esses dias tinha três personagens bem demarcados e distintos: o Gordo, a Puta e o Corno.
O enredo falava sobre um Corno que teria pego a sua mulher saindo do motel com seu amigo. Como forma de se vingar da ‘galha’ da patroa e da traição do amigo ‘pé-de-lã’, pediu para um conhecido filmar o flagra e divulgar nas redes sociais.
O circo foi armado e o público (todos nós) não só consumiu o enredo como se fosse um filme de ação, como se colocou no direito de ‘jogar bosta na Geni’, exaltar o gordinho ‘transão’ e rir (e fazer memes) até não poder mais do chifrudo inconformado.
O adultério revelado de Minas Gerais é só mais um vídeo de vingança propagandeado nas redes sociais. Tem o roteiro perfeito para atrair aqueles que apreciam a desgraça alheia. Mas que, no final, só confirma aquilo que muitos sabem: que todos os envolvidos na situação (inclusive você) tem sua parcela de culpa nessa história.
Vamos começar pelo Corno. É claro que sofrer a traição por alguém que você depositou a confiança e construiu um futuro ao lado dessa pessoa não é nada legal. É traumático e chocante. Mas, por mais ‘filhadaputa’ que tenha sido a companheira, nada justifica abusar, agredir fisicamente, humilhar e nem expor alguém dessa forma na internet.
A mulher traidora tem sua parcela de culpa ao ser infiel com seu companheiro. Errou pelas mentiras, pela traição e por fazer com um amigo em comum. Mas a sentença que esta pobre coitada teve foi a mais cruel de todas: um linchamento em praça pública (no caso na web), sem direito a defesa, sem direito à palavra ou tentar justificar coisa qualquer.
Fabíola recebeu uma humilhação maior que a da rainha Cersei, de Game of Thrones. Que, após confessar o crime de adultério, passou pela Caminhada da Vergonha. Teve o cabelo cortado curto e andou nua até chegar ao castelo. Durante o percurso, a multidão bradava palavras de censura, chamava-a de piranha, cuspiam, jogavam fezes e lixo em seu corpo.
O resultado não poderia ser outro: ela não sai de casa depois do ocorrido; rumores dão conta de que ela foi demitida do emprego; além de um trauma como se fosse uma cicatriz maldita no rosto que vai durar bem mais do que uma caminhada. Nunca mais vai se apagar pelo resto da sua vida.
O Leo, ou mais conhecido como gordinho amigo, foi o que melhor se saiu dos três. Tirando as avarias no carro, o fato dele ter uma família, ser casado, é pouco ou nada relevante para o enredo. Ele é foda porque é um ‘gordinho’ pegador, mesmo que o seu alvo seja a mulher do seu amigo.
É só parar e pensar, quem você viu discutindo a dupla traição que ele cometeu (com o amigo e a sua mulher).
Isso sem contar no ‘cinegrafista’ que filmou tudo, narrando e comentando o ocorrido, quase como uma cobertura minuto-a-minuto. Era praticamente um apresentador de programas policiais, divertindo-se e julgando a desgraça alheia.
Tomado pela raiva e pelo impulso, o marido decidiu resolver um problema particular publicamente. O resultado: será motivos de piada pelo resto da vida.
Ao invés de encarar os ônus da vida como um homem e não como um babaca, este preferiu tocar o foda-se e jogar tudo para o ar, pelo revanchismo de dar o troco. A história é uma prova de quanto preconceito e sexismo temos e que ainda falta muito para nossa sociedade amadurecer.
Que preferimos repassar vídeos e imagens de Revenge Porn do que refletir sobre o quão isso é errado e danoso não só para os integrantes da narrativa.
Que amanhã poderemos estar dentro dessas mesmas histórias, sendo protagonistas da traição ou da cornitude.
Da próxima vez que você receber um videozinho como este, pense bem antes de repassar. Você pode contribuir para o fim da vida social de uma pessoa, pode ser o juiz e o juri de uma sentença que colocará alguém no corredor de morte pelo resto da vida.
Será que seu prazer momentâneo de ver a justiça sendo feita pelas mãos de outra pessoa vale o seu compartilhamento? Você quer se sujar com este sangue e por este motivo?
Mas, como diria o velho Chico Buarque…
“Joana é mais uma mulata triste que errou/
Errou na dose/
Errou no amor/
Joana errou de João/
Ninguém notou/
Ninguém morou na dor que era o seu mal/
A dor da gente não sai no jornal”.
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