O Pai Perdoa – a arte de deixar a crítica de lado

Leia o desabafo feito de um pai para seu filho e aprenda a ser menos intransigente

Leia o desabafo feito de um pai para seu filho e aprenda a ser menos intransigente

Talvez um dos exercícios mais difíceis para o ser humano por em prática é deixar a crítica ao outro de lado. Analisar as falhas do comportamento alheio sem tentar entender os motivos que levaram a elas é o padrão da nossa sociedade. Na pressa por apontar culpados, não compreendemos os atos e nem reconhecer os nossos erros.

O resultado: acabamos por afastar as pessoas próximas da gente e nos isolamos em montanhas como velhos ermitões ranzinzas.

Um dos processos comuns dessa natureza e que, talvez carregamos desde os primeiros passos, é da crítica que os pais têm para seus filhos. Para muitos dos primeiros, a repreensão surge antes mesmo de tentar compreender a fase, a geração ou a evolução do pequeno. A sua ótica é a de que as coisas sempre estão muito melhores do que na sua época e, por isso, seu rebento deveria valorizar mais, fazer por merecer e não cometer os erros bobos que pratica.

A falta de paciência, o estresse cotidiano e as dificuldades financeiras e econômicas geram uma intransigência fora do comum. Então, ao invés de ser um amigo, espelho ou herói para seu filho, você acaba se transformando em um completo estranho, uma simples autoridade ditatorial em seu próprio lar.

Um texto que me fez abrir os olhos para a arte de perdoar foi um clássico do jornalismo norte-americano Father Forgets (O Pai Perdoa). Publicado inicialmente como um editorial no diário People’s Home Jornal, no início do século 19, ele já foi reproduzido milhares de vezes e em vários idiomas. Seu sucesso deve-se ao fato de ser um sensível e verdadeiro desabafo, que toca e faz o leitor refletir.

Apenas leia abaixo antes de qualquer coisa:

O Pai Perdoa (Father Forgets)

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Escute, filho: enquanto falo isso, você está deitado, dormindo, uma mãozinha enfiada debaixo do seu rosto, os cachinhos louros molhados de suor grudados na fronte. Entrei sozinho e sorrateiramente no seu quarto. Há poucos minutos atrás, enquanto eu estava sentado lendo meu jornal na biblioteca, fui assaltado por uma onda sufocante de remorso. E, sentindo-me culpado, vim para ficar ao lado de sua cama.

Andei pensando em algumas coisas, filho: tenho sido intransigente com você. Na hora em que se trocava para ir à escola, ralhei com você por não enxugar direito o rosto com a toalha. Chamei-lhe a atenção por não ter limpado os sapatos. Gritei furioso com você por ter atirado alguns de seus pertences no chão.

Durante o café da manhã, também impliquei com algumas coisas. Você derramou o café fora da xícara. Não mastigou a comida. Pôs o cotovelo sobre a mesa. Passou manteiga demais no pão. E quando começou a brincar e eu estava saindo para pegar o trem, você se virou, abanou a mão e disse: “Chau, papai!” e, franzindo o cenho, em resposta lhe disse: “Endireite esses ombros!”

De tardezinha, tudo recomeçou. Voltei e quando cheguei perto de casa vi-o ajoelhado, jogando bolinha de gude. Suas meias estavam rasgadas. Humilhei-o diante de seus amiguinhos fazendo-o entrar na minha frente. As meias são caras – Se você as comprasse tomaria mais cuidado com elas! Imagine isso, filho, dito por um pai!

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Mais tarde, quando eu lia na biblioteca, lembra-se de como me procurou, timidamente, uma espécie de mágoa impressa nos seus olhos? Quando afastei meu olhar do jornal, irritado com a interrupção, você parou à porta: “O que é que você quer?”, perguntei implacável.

Você não disse nada, mas saiu correndo num ímpeto na minha direção, passou seus braços em torno do meu pescoço e me beijou; seus braços foram se apertando com uma afeição pura que Deus fazia crescer em seu coração e que nenhuma indiferença conseguiria extirpar. A seguir retirou-se, subindo correndo os degraus da escada.

Bom, meu filho, não passou muito tempo e meus dedos se afrouxaram, o jornal escorregou por entre eles, e um medo terrível e nauseante tomou conta de mim. Que estava o hábito fazendo de mim? O hábito de ficar achando erros, de fazer reprimendas? Era dessa maneira que eu o vinha recompensando por ser uma criança. Não que não o amasse; o fato é que eu esperava demais da juventude. Eu o avaliava pelos padrões da minha própria vida.

E havia tanto de bom, de belo e de verdadeiro no seu caráter. Seu coraçãozinho era tão grande quanto o sol que subia por detrás das colinas. E isto eu percebi pelo seu gesto espontâneo de correr e de dar-me um beijo de boa noite. Nada mais me importa nesta noite, filho. Entrei na penumbra do seu quarto e ajoelhei-me ao lado de sua cama, envergonhado!

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É uma expiação inútil; sei que, se você estivesse acordado, não compreenderia essas coisas. Mas amanhã eu serei um papai de verdade! Serei seu amigo, sofrerei quando você sofrer, rirei quando você rir. Morderei minha língua quando palavras impacientes quiserem sair pela minha boca. Eu irei dizer e repetir, como se fosse um ritual: “Ele é apenas um menino, um menininho!”

Receio que o tenha visto até aqui como um homem feito. Mas, olhando-o agora, filho, encolhido e amedrontado no seu ninho, certifico-me de que é um bebê. Ainda ontem esteve nos braços de sua mãe, a cabeça deitada no ombro dela. Exigi muito de você, exigi muito.

Lembre-se de que qualquer idiota é capaz de praticar a crítica (e é exatamente isto o que a maioria faz). Ao invés de condenar ou apontar os erros alheios, tente compreendê-lo e perdoá-lo.

Exerça a tolerância e o mundo será um lugar muito mais fácil para os outros e, principalmente, para você viver.

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Leonardo Filomeno
Leonardo Filomeno

Jornalista, Sommelier de Cervejas, fã de esportes e um camarada que vive dando pitacos na vida alheia

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