Cerveja não é coisa de mulher. Mito ou verdade?

Apesar do fermentado estar ligado ao público masculino, foram elas que difundiram a cultura cervejeira ao longo da história

Quando pensamos em cerveja, alguns logo imaginam homens beberrões reunidos, levantando suas canecas de litro em bares sujos e proferindo palavras de baixo calão. Mas será que o fermentado é, realmente uma bebida masculina?

Desculpe-me ser o portador de más notícias para quem pensa assim, mas a verdade é que ao longo da história da cerveja, a mulher foi muito mais atuante do que o homem.

Essa visão forjada de que a mulher tem horror patológico do fermentado, além de ser a inimiga número 1 das reuniões masculinas regadas a cerveja é algo recente. Você sabia?

Quem inventou a cerveja?

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Apesar de não ter um registro certo do(a) abençoado(a) criador(a) da cerveja, Ela teria surgido nesta época há mais de sete mil anos, nas terras férteis da Mesopotâmia. O fermentado teria sito uma das primeiras bebidas alcoólicas criadas pelo homem (quer dizer, pela mulher).

Como a divisão dos trabalhos já existia, enquanto o homem praticava a caça, cabia a mulher apanhar os grãos do campo e cozinhar. Uma delas, provavelmente, acabou por esquecer um recipiente cheio de grãos ao relento. A água da chuva germinou-os – iniciando um processo de malteação (necessário para desenvolver enzimas para fabricação de cerveja).

Para não desperdiçar, esta aqueceu o recipiente e o líquido resultante era açucarado, que ficou fermentando na temperatura ambiente. Ao provar a iguaria e aprovar o sabor (e a brisa alcoólica), temos então a primitiva cerveja.

Relação da mulher com a cerveja na história

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Cerca de 6 mil anos depois, na Suméria, o destaque era Ninkasi, a deusa cervejeira, uma das primeiras divindades inventadas pelo imaginário humano. Vale lembrar que, na época, a cerveja era considerada alimento, por possuir nutrientes e ser a opção mais segura de consumo, em meio a águas contaminadas.

Os povos babilônicos, fundados há 4 mil anos, adicionaram ervas de propriedade alucinógenas e afrodisíacas na cerveja. Para variar, quem tomava conta das tavernas e produzia a brejas eram as mulheres. Na sociedade egípcia, épocas seguintes, também cabia a mulher a administração doméstica, a fabricação do pão e da cerveja.

Registros do século 13, de uma pequena cidade inglesa, apontam que somente 8% dos cervejeiros locais eram homens. Além disso, como era permitido vender o excedente da produção, as mulheres exploraram suas habilidades como um negócio que se tornou um importante complemento financeiro para a família.

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Para anunciar que a cerveja estava pronta, elas expunham na porta da casa uma haste com folhas verdes – um sinal aos interessados -, recriando assim as famosas tabernas cervejeiras introduzidas pelos romanos séculos antes naquele país. Essas mulheres eram chamadas de alewives. Esses espaços foram os embriões dos pubs.

Na Idade Média, foi Hildegarda de Binden, em um mosteiro alemão, a mulher responsável por colocar o lúpulo na cerveja, para conservar o líquido e proporcionar saúde física às pessoas. Na época, a planta que crescia como erva daninha era usada como chá contra ‘desvios de espírito’ (desejo sexual, más pensamentos e para preservar a castidade). A cervejeira virou Santa desde então.

Nota-se tratamento parecido em casos menos antigos, como as requisitadas reuniões na casa de Martinho Lutero, onde os visitantes eram recebidos em jantares deliciosos acompanhados pela cerveja caseira produzida por sua esposa Catarina.

Uma mulher cervejeira era muito apreciada, por isso, Alreck, rei de Hordaland (Noruega), elegeu Geirhild para sua rainha, não pela sua beleza ou pela sua riqueza, mas sim porque sabia fazer uma boa cerveja.

O domínio feminino na produção cervejeira só diminuiu no final do século 18, quando o “negócio” da cerveja despertou a presença masculina e grandes empresas surgiram, iniciando-se a produção em grande escala.

As mulheres só puderam reassumir seu importante papel na cultura cervejeira durante a Primeira Grande Guerra, a fim de suprir os soldados nas frentes de batalha. Posteriormente, no final do século 20, como profissionais cervejeiras e como consumidoras exigentes.

Outras curiosidades cervejeiras envolvendo a mulher

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– Segundo uma lenda escandinava, o guerreiro morto em combate conseguiria a imortalidade se tivesse bebido cerveja feita pelas Valquírias.

– Entre os vikings, era lei que somente as mulheres podiam produzir cerveja, e todo o equipamento usado para esse fim era propriedade exclusiva da cervejeira.

– Na cultura inca, antes de serem oferecidas em sacrifício ao deus Sol, as virgens preparavam para o Imperador uma cerveja de milho, chamada chicha.

– Na Inglaterra, as boas esposas cervejeiras eram tão populares que muitas pessoas iam até suas casas para aproveitar a hospitalidade regada a vários copos da bebida.

– Até o século XVI, na região norte da Alemanha, os utensílios para produção de cerveja faziam parte do enxoval das noivas.

– No século XIX, na província de Mecklembourg, ainda era tradição que a recém-casada recitasse: “Meu Deus, ajude a cerveja quando eu a produzir, ajude o pão quando eu o amassar”.

Mulheres e cerveja nos dias de hoje

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Atualmente, a mulher tem especial destaque nos estudos de mercado das cervejarias. De olho nas mudanças de hábitos da sociedade, em especial à crescente participação feminina no consumo da bebida, alguns responsáveis pelas decisões de marketing têm proposto mudanças significativas nas campanhas e no perfil de novos de produtos.

Apesar de no país a coisa ainda engatinhar, cada vez mais ganha força a mensagem feminina, tornando os comerciais mais inteligentes e sofisticados, em detrimento da imagem “machista” e competitiva das propagandas.

Hoje, no Brasil, erra quem pensa que o setor cervejeiro é completamente dominado pelos homens. Confira algumas mulheres que atuam no mercado e que fazem jus a história de que cerveja é coisa de mulher, sim!

Amanda Henriques: sommelier de cerveja
Amanda Reitenbach: beer sommelier
– Bia Amorim: beer sommelier
– Cilene Saorin: mestre cervejeira
Carolina Oda: beer sommelier
– Fabiana Arreguy: jornalista especializada no setor
– Fernanda Fregonesi: Biomédica, microbióloga, oferecendo cursos sobre fermentação e leveduras cervejeiras
– Fernanda Ueno: mestre cervejeira
– Gabriela Montandon: beer sommelier e cervejeira caseira
– Kathia Zanatta: beer sommelier e Mestre Cervejeira
– Maíra Kimura: sócia e cervejeira da 2cabeças
– Mariana Schneider: Homebrewer
– Suelen Presser: mestre cervejeira
– Tatiana Spogis: beer sommelier

O que isto quer dizer, então?

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Isso quer dizer que o fermentado de água, malte, lúpulo e fermento é propriedade delas e os homens deveriam sair de perto? Não! Estes motivos apresentados servem para você deixar o preconceito de lado e curtir uma cerveja de boa, pois afinal, o importante é a sua paixão pelo fermentado, não interessa se ela é produzida por homens e mulheres.

Chame sua mulher para brindar com você. São mais de 120 estilos de cerveja e, com certeza, existe um (ou mais de um) ideal para cada pessoa. Vamos difundir a cultura cervejeira sem preconceito e para todos os gostos e paladares.

Cheers!

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Leonardo Filomeno
Leonardo Filomeno

Jornalista, Sommelier de Cervejas, fã de esportes e um camarada que vive dando pitacos na vida alheia

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