O que faz de uma cerveja, cerveja? Malte, lúpulo, água e leveduras, certo? Nem tanto. A cerveja brasileira contém 45% de milho em vez de cevada. E para quem acha que é uma safadeza das marcas, ledo engano.
O uso do milho na cerveja tem o aval da legislação brasileira – até 50% da cevada pode ser substituída por cereais não maltados. Cereais Não Maltados. Nome mais difícil e que a maioria dos consumidores deixa passar batido.
Segundo as fabricantes, o uso do milho – ou cereais não maltados – serve para evitar que a bebida gere corpo, criando-se assim cervejas mais leves. Estas, ideais para dias quentes e para serem bebidas em grandes quantidades.
Segundo os especialistas, a troca existe porque o milho chega a ser 30% mais barato do que a cevada. Além disso, os cereais das espigas serviriam para o processo de produção, cortando custos para as empresas. Este aumento de velocidade cobra um preço.
Perdemos qualidade e alguns valores nutritivos pertencentes às cervejas de puro malte. Mas a pergunta é: Quem se importa?
O milho não é um problema
Fato: O consumidor padrão brasileiro não está acostumado à uma cerveja mais encorpada, com mais amargor ou com mais personalidade para o consumo no dia a dia.
Se você perguntar no boteco da esquina se o tiozinho se importa com o uso do milho, a resposta provavelmente será não. Se for fazer pergunta em um evento onde o consumo de cerveja é alto, como um Carnaval ou nos arredores de um estádio de de futebol, pior ainda.
Será que uma cerveja mais pesada como uma IPA ou uma Stout seria uma boa indicação para consumo em um país quente como o nosso? Você se imagina o povão, acostumado a uma cerveja mais aguada, dividindo um isoporzinho de trapistas na beira da piscina ou da praia em um dia de sol?
Imagina ter que pagar o preço de uma cerveja especial na cerveja do boteco dia a dia? Será que todo mundo toparia pagar a mais só para tomar aquela cerveja rápida no fim do expediente? Seria até aceitável termos uma cerveja mais leve e feita de milho, se não fosse o jeito brasileiro de fazer as coisas.
O jeito brasileiro de usar milho
Muitas boas cervejas do mundo levam cereais não maltados em sua composição e não seria problema nenhum reproduzirmos esse modelo. O problema está na forma como as grandes marcas tentam ocultar o milho de suas receitas.
Apesar de um estudo da USP provar que o uso de milho na cerveja chegava até 45%, muitas das marcas recusam o número, muito próximo dos 50% liberados por lei. Pior, a legislação permite que as mesmas nem precisem divulgar o quanto de milho ou arroz é utilizado na fórmula de nossa cerveja.
Para ajudar, alguns anos atrás a Folha revelou que muitas das cervejarias estavam batalhando para colocar ainda mais milho na fórmula da cerveja. Quase um curau. E ainda tem mais um agravante.
Na safra de 2013 do total de milho produzido no país, 89,9% era transgênico, o milho produzido desta forma está envolvido em uma série de polêmicas sobre saúde, como aponta essa matéria da revista Carta Capital.
E, para encerrar, fica a pergunta. Se estamos utilizando milho que é mais barato que cevada e que agiliza a produção reduzindo custos, por que parece que o consumidor final não sente esse valor sendo abatido no produto final? Será que com o uso do milho, alguma marca estaria gastando menos e ganhando mais?
O problema é só o milho na cerveja? Não. O motivo pelos quais muitos cervejeiros implicam é com a falta de transparência com o público no quesito cereais não maltados. Principalmente no fato das marcas não especificarem quais são esses cereais e quais as quantidades utilizadas, camuflando assim os ingredientes.
Somos o 3º maior produtor de cerveja do mundo, com 86,7 bilhões de litros vendidos ao ano por anos. Cerveja não é só um goró, é um rito social e paixão nacional. Podiam tratar nosso amor e devoção com um pouquinho mais de respeito. Não?
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