Master Chef Brasil: muito tempero para pouco sabor

No Master Chef Brasil prevalece sempre o barraco, a discussão, a indução ao erro e as críticas ferozes.

Master Chef Brasil: muito tempero para pouco sabor

Recentemente me mudei e na minha antiga casa e, na que morei antes dela, não tinha tevê. Não por uma questão idealista, mas como sou mais apegado a filmes e séries à programação normal da televisiva brasileira não me sensibiliza.

A última novela que assisti foi Avenida Brasil, muito boa por sinal. Mas confesso que sinto uma falta de paciência com a tevê aberta. Recentemente acabaram com a Sessão da Tarde e os desenhos nas manhãs da Rede Globo.

Só consigo pensar: “O que será dessa nova geração?”. Enfim, chega, porque de nostalgia a internet está cheia. No novo lar, o leque de programação a cabo é alta, temos todos os canais possíveis e imagináveis. De reality shows de maquiagens e efeitos especiais até programas de leilões e barganhas, que também comecei a ver freneticamente.

As noites têm sido divertidas com alguns destes programas, tenho visto menos filmes para seguir uma busca solitária através do controle remoto por opções que me entreguem mais a realidade.

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Numa destas noites dei de cara com o Master Chef Brasil, na Band. Já estava ensaiando para assistir o programa, pois além de amar cozinhar, estava curioso para ver o desenrolar da versão brasileira.

A junção de show de televisão com gastronomia parecia o encontro de dois mundos perfeitos para minha pessoa, afinal também me considero um cozinheiro amador. Esse raciocínio ganhou mais força após assistir recentemente várias edições da versão australiana do Master Chef no TLC. Fiquei fascinado.

É possível aprender as receitas. Chefs e aspirantes discutem severamente os ingredientes e os métodos de preparo, além da possibilidade de participantes concorrerem diretamente com os chefs, o que os tira da zona de conforto, forçando-os a mostrar porque estão ali de fato. Impossível ver a versão australiana e acabar o programa sem uma fome de leão.

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Se compararmos com versões internacionais, principalmente a australiana que é bárbara, o Brasil parou na entrada. Não tem prato principal, muito menos sobremesa.

O Master Chef Brasil não tem sabor, parece aquele “mexidão” que fazemos com as sobras do almoço de ontem. Nos primeiros programas se mostrava bem, porém, a crescente audiência foi nefasta.

O “boom” de memes que faz a internet parar nas noites de terças, induziu os chefs a focarem ainda mais na postura de verdadeiros generais de doma (que eles não usam por não estarem em ação), tornando-os mais maléficos e sádicos com os participantes, a quem resta um sofrimento contido e o medo com o futuro incerto dentro da atração.

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Os três chefs escolhidos para julgar os aspirantes a cozinheiros são o brasileiro Henrique Fogaça (Sal Gastronomia), o francês Erick Jacquin (Tartar&Co) e a argentina Paola Carosella (Arturito).

O trio ainda conta com a presença sem sal de Ana Paula Padrão que tem a missão de conduzir o Master Chef Brasil, atuando como agregadora entre chefs e aspirantes.

Apesar da capa da Veja desta semana dizer o contrário, a ex apresentadora de telejornal peca em sua missão e isso é unanimidade entre os internautas que não poupam críticas a ela. O trio de jurados tem uma empatia nervosa entre si, o que acaba sempre ofuscando a apresentadora e muitas vezes tornando-a invisível.

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O fato dos chefs tentarem a todo custo incitar os participantes ao erro através do medo e apreensão faz parecer que estamos diante de uma exibição de “Tropa de Elite” e não de um programa gastronômico. Mais uma vez reitero e isso é uma opinião pessoal, acredito que um programa nesse molde poderia ser usado para aumentar também o conhecimento do público sobre as receitas, técnicas e sabores.

Descobri também falando com amigos chefs que dentro das grandes cozinhas existe sim uma relação de hierarquia, onde a disciplina e respeito são vitais. Mas todos eles foram unanimes em concordar que dentro do programa da Band o exagero é caricato por parte dos apresentadores.

No Master Chef Brasil prevalece sempre o barraco, a discussão, a indução ao erro e as críticas ferozes. A relação entre chefs e participantes em muito lembra aquele professor carrasco dos tempos de escola, onde fazíamos as lições e estudávamos para as provas apenas por medo do que poderia acontecer.

Esse tipo de comportamento é quase uma ditadura e, é claro, acaba empobrecendo os pratos que, executados sob pressão e receio, acabam ficando muito aquém do esperado.

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O resultado visto na avaliação dos chefs faz com que eles muitas vezes quase se recusem a experimentá-los, num exercício teatral que passa longe da naturalidade vista nas grandes cozinhas mundo a fora. A Rede Bandeirantes errou o ponto.

E, com isso, perdeu a oportunidade de fazer a gastronomia entrar na casa do brasileiro de uma maneira mais verdadeira, aumentando assim sua preocupação com os alimentos que vai consumir e receitas que poderiam enriquecer o paladar e a saúde.

A minha conclusão é que brasileiro, de modo geral, gosta de formatos mastigados e transformados em uma grande novela, recheada de dramalhões e choradeiras.

O povo quer mesmo ver os participantes sofrerem na mão de quem tem poder, escolher bodes expiatórios e torná-los vilões dentro do show, enquanto outros viram os queridinhos. Até aí tudo bem, também tenho meu participante preferido e não tenho afinidades com um ou outro.

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Mas fazer disso uma dramatização da realidade, onde a torcida, as criticas e piadas são direcionadas quase que exclusivamente aos participantes e as caras e bocas dos chefs, mostrando todo seu mau humor, fogem do objetivo de apreciar pratos e sabores apresentados, o que, volto a repetir, deveria ser o personagem principal de um programa que se propõe a difundir a cultura gastronômica.

Estou adaptado a casa nova, mas a briga com o controle remoto continua.  Principalmente ás terças-feiras, na hora do Master Chef Brasil. Não porque tenho acompanhado o programa com afinco, mas após ver os comentários de cada uma das provas no Twitter me rendi.

Lá, as pérolas postadas provam que, o brasileiro pode errar a medida quando o assunto é reality show gastronômico, mas nunca quando é bom humor e criatividade.

► Texto escrito por Leonardo Castelo Branco, redator e roteirista. Escreveu o curta Fui Comprar Cigarros: http://vimeo.com/48261836.

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Colaboradores MHM
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